Na peça do Público de hoje que noticia a morte de Anner Bylsma, cita-se no título uma sua frase, "o homem que dizia que cada nota devia estar "grávida da seguinte". Esta expressão, deveras extraordinária, capta aquilo que me parece ser o aspecto mais essencial da música tanto no que respeita à interpretação como no que respeita à composição: a condução do discurso musical (por outras palavras)
Na teoria musical tonal tradicional a nota mais "grávida" de uma escala será a sensível - na escala de Dó o Si.
Nas teorias dos russos da passagem do século XIX para XX Boris Yavorsky e Boris Asafief, teóricos importantes para a formação e diversos modos de pensar escalas e modos - de certo modo já presentes nem que parcialmente na música de Scriabin - e formar ou informar modos de pensamento musical dos compositores russos da geração seguinte como Shostakovich. Para estes tériocos eram as notas fá-si tanto harmonicamente como também enquanto base de estruturas melódicas e escalares de todos os pontos de vista do desenrolar musical, era aquela "díade", aquele intervalo de trítono, que continha em si a pulsão crucial para a resolução tanto meio-abaixo como meio-tom acima, ou seja resolução para mi-do ou inversamente para fá#-lá#. Nestas ideias está presente a relação de trítono entre dó e fá# - frequente em obras de Scriabin - tal como, de outro modo, as escalas octatónicas de Rimski-Korsakov e, logo de seguida, usadas pelo seu aluno Stravinsky.
É óbvio que na música tonal se verificava o mesmo, mas o fá-si na música tonal ocidental era visto, julgo, mais enquanto elemento harmónico-vertical (parte do acorde de sétima da dominante - (sol-si-re-fá) - e, de certo modo era desse modo que se sobrepunha como motor da resolução "final" dominante-tónica. Portanto a realização das funções tonais V-I.
Esta é teoria elementar que todos os músicos conhecem.
Na teoria musical tonal tradicional a nota mais "grávida" de uma escala será a sensível - na escala de Dó o Si.
Nas teorias dos russos da passagem do século XIX para XX Boris Yavorsky e Boris Asafief, teóricos importantes para a formação e diversos modos de pensar escalas e modos - de certo modo já presentes nem que parcialmente na música de Scriabin - e formar ou informar modos de pensamento musical dos compositores russos da geração seguinte como Shostakovich. Para estes tériocos eram as notas fá-si tanto harmonicamente como também enquanto base de estruturas melódicas e escalares de todos os pontos de vista do desenrolar musical, era aquela "díade", aquele intervalo de trítono, que continha em si a pulsão crucial para a resolução tanto meio-abaixo como meio-tom acima, ou seja resolução para mi-do ou inversamente para fá#-lá#. Nestas ideias está presente a relação de trítono entre dó e fá# - frequente em obras de Scriabin - tal como, de outro modo, as escalas octatónicas de Rimski-Korsakov e, logo de seguida, usadas pelo seu aluno Stravinsky.
É óbvio que na música tonal se verificava o mesmo, mas o fá-si na música tonal ocidental era visto, julgo, mais enquanto elemento harmónico-vertical (parte do acorde de sétima da dominante - (sol-si-re-fá) - e, de certo modo era desse modo que se sobrepunha como motor da resolução "final" dominante-tónica. Portanto a realização das funções tonais V-I.
Esta é teoria elementar que todos os músicos conhecem.
Penso, não obstante, que qualquer nota em contextos dados se pode tornar "sensível" ou seja, encarnar uma força que se dirige para uma resolução ou outra ou mesmo para a sua não-resolução o que lhe atribui todo um outro campo de possibilidades. Nas minhas últimas peças a partir do Concerto para Violino até Sinfonia (subjetiva) esta problemática esteve muito presente durante a composição dessas quatro obras.
Na música de Mahler nós vemos permanentemente o jogo (spiel) entre resolver ou não resolver, ou resolver para ali e depois para acolá, etc. Pode-se dizer que também em Beethoven tais situações abundam e estará certo. Aparentemente trata-se de um facto conhecido pelos estudiosos de música: resolução por cadência perfeita ou cadências interrompidas ou evitadas existem em muita música do barroco até Wagner e Mahler. Certo. Mas que enorme diferença no uso mais antigo e aquele da passagem dos séculos XIX-XX! E sobretudo que potencial ainda existirá por explorar nas obras e nas técnicas dos mais próximos de nós. As fases de transição são sempre de uma enorme riqueza. As regras ainda não estão suficientemente estabelecidas e esse facto cria novas "maneiras", abertas a desenvolvimentos ainda por explorar.
A expressão de Bylsma alarga esta pulsão a cada nota e torna-a crucial para o discurso no seu todo. Cada nota tem sempre uma outra a seguir (excepto se for a última) e aquilo que a sua expressão põe em destaque é a continuidade do discurso, a sua razão de ser em cada momento, a condução de nota para nota. Uma e depois outra, seja qual for a sua relação de intervalo, tem de parecer "grávida" da seguinte, tem de estar justificada ou preparada para que a seguinte seja plenamente compreendida pelo ouvinte como lógica ou bela, portadora de prazer ou surpreendente, o que será o caso das não resolvidas embora no entanto grávidas. É possível a "sensibilização" de qualquer nota num novo quadro ainda por realizar.
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