quarta-feira, 1 de maio de 2019

As transformações históricas da designação 'música clássica'

Nenhum termo passou mais adequadamente de um significado estrito original a outro mais alargado do que o de 'música clássica'. Historicamente basta o usar o título de um livro famoso de Charles Rosen The Classical Style: Haydn, Mozart, Beethoven para se circunscrever a origem e o âmbito: um certo estilo de um certo tempo. Hoje, depois de um processo histórico complexo o termo "música clássica" alargou-se no tempo - para trás e para a frente - e é aplicado sem aquele rigor original, mas com outro tipo de justeza diversa. Designa na acepção geral e comum, toda a música da tradição escrita ocidental que usa um certo tipo de instrumentos - a orquestra, por exemplo, e o seu repertório canónico das salas de concertos entre muitas outros tipos de formações vocais e instrumentais quer anteriores quer posteriores - esse número foi-se transformando e crescendo), tem os seus espaços próprios, os seus mitos, o seu sagrado. Quem não olha de perto esta prática musical muitas vezes se refere a ela sem hesitação como "a clássica" mesmo que do primeiro ponto de vista um determinado concerto possa até não incluir nenhuma obra do dito período original de Rosen. (Viena 1800 grosso modo). Pode não incluir nenhuma música clássica stritu senso mas o que inclui é a tradição hoje muito mais vasta na qual ela foi um momento decisivo. Tão decisivo como fundador de a longo prazo de uma identidade, de um ensino especifico, de instituições próprias. Acrescenta tanto para o seu passado e como para a sua posteridade, com um sentimento de partilha, de pertença àquela identidade sonora e histórica; implicitamente tanto agrega por um lado, como distingue por outro face a muitas outras práticas musicais. É um signo que se usa para identificar para o seu interior e distinguir para o seu exterior (que não obstante existe no seu igualmente vasto número). Não há nenhum problema, porque a diversidade do mundo é incomensurável desde que se saiba que história é esta. Por isso, Richard Taruskin escreve no seu prefácio da Oxford History of Western Music (2004) o título "A History of What?" na edição original de capa dura.

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